Crônica do escritor e jornalista Ramon Barbosa Franco -
assessor de imprensa da Associação dos Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos de
Marília - faz referência ao escritor Monteiro Lobato (1882-1948), ao comentar o
crescimento surpreendente da cafeicultura na região de Garça, uma das únicas
três regiões do Estado de São Paulo a possuir o selo de Indicação Geográfica, o
IG, ao lado da Alta Mogiana e da Região de Pinhal
por Ramon Barbosa Franco
Tudo começa com uma xícara de café, inclusive o nosso dia, na maioria
das casas, não? O café é uma das mais valorizadas commodities mundiais, ficando
atrás somente do petróleo. Commodity é uma mercadoria de origem primária, de
consumo mundial, e por isso sua negociação ocorre nas bolsas de valores. No
mundo financeiro, com destaque à operação de mercado futuro, o café só perde
para o petróleo. Uma das três bebidas mais populares, ao lado do chá e da água,
tem ligação com a fundação de Marília e com a colonização do Oeste paulista.
No livro ‘Cidades Mortas’, publicado no ano de 1919, o escritor
Monteiro Lobato descreve numa série de contos a derrocada do Vale do Paraíba
paulista após a decadência do parque cafeeiro. No mesmo ano em que o autor do
Sítio do Pica-pau Amarelo trouxe à tona suas 25 narrativas enxutas, entre elas
‘Os perturbadores do silêncio’, ‘A vida em Oblivion’ e ‘A noite de São João’,
Antônio Pereira e seu filho Pereirinha iniciavam a ocupação do espigão elevado
que inicialmente fora chamado de Alto Cafezal e, posteriormente, viria a se
tornar o Município de Marília. No Estado de São Paulo, que como ficou claro tem
sua história ligada à oligarquia cafeeira - sendo inclusive, ao lado de Minas,
a locomotiva política da Primeira República, na época do ‘café (SP) com leite
(MG)’ - três regiões possuem o reconhecimento de Indicação Geográfica (IG)
junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa): Alta Mogiana, Região de Pinhal (Média
Mogiana) e Região de Garça. Existem duas
modalidades de IG, a Denominação de Origem (DO) e a Indicação de Procedência
(IP). A indicação de origem de Garça, por sua vez, abrange 15 cidades e Marília
está entre elas, além de Fernão e Vera Cruz.
A primeira exportação do café produzido na região de Garça é datada de
1968 e atualmente mais de 20 países sentem o gosto do nosso café. A tendência
dos parques cafeeiros desta região é o aperfeiçoamento, seja na técnica do
plantio, no manejo - inclusive com irrigação precisa - processos de secagem,
estocagem e distribuição. O parque cafeeiro da Alta Mogiana, região que abrange
Franca, Patrocínio Paulista, Batatais e outras 12 cidades é cultivado há mais
de 100 anos, enquanto o da Região de Pinhal - que engloba Espírito Santo do
Pinhal, Estiva Gerbi, entre outros quase na divisa com Minas Gerais - vem sendo
produzido desde o ano de 1850. Das três regiões, Garça é a ‘caçulinha’ e sua
tendência é sim despontar para inúmeros consumidores ávidos em degustar a nova
procedência. A afirmação é técnica, e não ufanista em defesa da nossa bebida,
pois a cada ano as fazendas produtoras de café da nossa região se aperfeiçoam e
buscam a qualidade de modo permanente. Antes de encerrar, lembro que atualmente
o café gera 8 milhões de empregos diretos no Brasil e o país é o maior produtor
de café com certificação, segundo dados oficiais. E se fosse permitido, um
século depois de ‘Cidades Mortas’, no Vale do Paraíba, Lobato poderia escrever
contos sobre a cafeicultura da região de Garça sob o título de ‘Cidades Vivas’!
Ramon
Barbosa Franco é escritor e jornalista, autor dos livros ‘Canavial, os vivos e
os mortos’ (La Musetta Editoriais), ‘A próxima Colombina’ (Carlini &
Caniato), ‘Contos do japim’ (Carlini & Caniato), ‘Vargas, um legado
político’ (Carlini & Caniato), ‘Laurinda Frade, receitas da vida’ (Poiesis
Editora) e das HQs ‘Radius’ (Mustache Comics), ‘Os canônicos’ (LM Comics) e
‘Onde nasce a Luz’ (Unimar – Universidade de Marília), ramonimprensa@gmail.com