Regulamentações visam melhor segurança, promovendo avanços na proteção ambiental, capacitação profissional e sinalização internacional Pela estrada ou pela cidade com certeza, constantemente, é possível cruzar com caminhão transportando um produto químico de alto risco, seja combustível, gases inflamáveis, tóxicos, substâncias corrosivas, entre outros. Mas como é feito o trâmite para que a circulação desses compostos seja realizada com segurança e proteção não só para as pessoas, como também para o meio ambiente? As precauções vão muito além das sinalizações de rótulos de risco e painéis de seguridade. O cumprimento rigoroso das normas e regulamentações é indispensável para mitigar os perigos e garantir a integridade durante o processo, função que cabe à área tecnológica, especialmente à Engenharia de Segurança do Trabalho. Os profissionais desta modalidade devem estar atentos às diretrizes da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que estabelecem padrões técnicos para o transporte de produtos perigosos, e ao Decreto n.º 96.044/1988, que regulamenta o transporte rodoviário desses conteúdos em território nacional. “A legislação busca garantir a segurança do meio ambiente e da sociedade como um todo”, avaliou o engenheiro mecânico Norival Gonçalves, membro da Câmara Especializada de Engenharia Mecânica e Metalúrgica (CEEMM) do Crea SP (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo). Já compreender referências de fora do Brasil pode ser um diferencial. “O Brasil é signatário de convenções internacionais e mesclou as regras do regulamento europeu com o americano. Eu diria que o país não deixa nada a desejar em relação às nações mais desenvolvidas quanto ao rigor da fiscalização e controle dessa atividade”, argumentou o gerente do setor de Atendimento a Emergências da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), advogado Mauro de Souza Teixeira. O melhor caminho é sempre a prevenção e a tecnologia tem sido grande aliada, como a telemetria. A ferramenta é utilizada para identificar o comportamento do motorista ao dirigir, bem como auxiliar no controle de horas trabalhadas. “O condutor que estiver carregando o produto perigoso deve ter um treinamento especializado em que são abordadas todas as matérias relacionadas à classificação e manuseio, como primeiros socorros. Eles possuem capacitação estabelecidas também por outras autoridades, como o Ministério do Trabalho”, evidenciou o coordenador de Regulação do Transporte Rodoviário de Cargas da ANTT, químico Rodrigo Lúcius de Amorim. É obrigatória ainda uma habilitação específica. Do ponto de vista regulatório, alguns outros fatores são levados em conta a fim de mitigar eventuais acidentes, como restrição de horário para os veículos transportadores, proibição em certos locais, treinamentos para motoristas e proteção ambiental por meio da aquisição de licenças. No Estado de São Paulo, por exemplo, a circulação de produtos químicos é proibida em horários de pico e trânsito acentuado. Em algumas regiões consideradas de risco para a população, como o sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento público de água, o tráfego também é vedado. Com relação aos danos ambientais, a legislação traz algumas prescrições. Existem obrigações em contratar seguros e é importante que haja imediatamente a comunicação aos órgãos de intervenção, em caso de problemas. “Será necessário acionar diversas agências, realizar o isolamento da área, chamar a polícia e o corpo de bombeiros, e a administradora da rodovia. Assim como também acionar a Defesa Civil, órgãos de saúde e comunicar o órgão ambiental”, explicou Teixeira. Isso porque, de acordo com o gerente da Cetesb, as ocorrências demandam uma ação integrada e todos precisam ter conhecimento do perigo da substância. Desde agosto deste ano, a Cetesb coordena a Comissão de Estudos e Prevenção de Acidentes no Transporte Rodoviário de Produtos Perigosos, em ação vinculada à Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil) do governo do estado de São Paulo. É também na Cetesb que há um centro de controle, em operação 24 horas por dia, com equipes posicionadas e de sobreaviso para o atendimento emergencial. “Essa equipe precisa de preparo e alguns recursos adequados, porque senão eles não poderiam nem se aproximar de um cenário acidental”, salienta o advogado. Os dados apontam o motivo: foram 12.985 registros relacionados ao deslocamento de cargas perigosas no período de 1978 a janeiro de 2024, com 47% das ocorrências acontecendo no modal rodoviário, segundo números do Sistema de Informações sobre Emergências Químicas (SIEQ). Enquanto isso, o órgão responsável por regulamentar a condução de produtos químicos é a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). A Resolução n.º 5.998/2022 estabelece os requisitos e as regras para esse tipo de locomoção, e é reconhecida mundialmente. “A regulamentação exige o acondicionamento dos produtos em embalagens adequadas, que devem passar por testes em ensaios de queda, de empilhamento e de percussão”, detalhou Amorim. Ele explicou que os protocolos são necessários para assegurar que as embalagens dos produtos perigosos são compatíveis com o risco físico ou químico. Todos os testes são realizados por organismos acreditados pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro). “Ademais os ensaios, as embalagens são identificadas com rótulos de risco e o nome do produto que está sendo transportado, justamente para indicar a qualquer usuário que aquela embalagem está condicionando algo perigoso e é preciso ter cautela no manuseio e na movimentação do volume”, complementou Amorim. Certificação de Inspeção Veicular (CIV) e o Certificado de Inspeção para o Transporte de Produtos Perigosos (CIPP) Inclusive, a Certificação de Inspeção Veicular (CIV) e o Certificado de Inspeção para o Transporte de Produtos Perigosos (CIPP) são alguns dos avais emitidos para os carros, garantindo a integridade e adequação dos equipamentos. Neste aspecto, Gonçalves ressalta que as inspeções são realizadas na fabricação e na manutenção dos veículos, avaliando a parte rodante, como freios, luzes, sinalização, parachoque, quinta roda etc. “Essas certificações permitem que as empresas façam inspeções periódicas. Um tanque de gás tem inspeção e fabricação diferentes de um de gasolina. Assim como os tanques que transportam cloro e outros produtos perigosos”, disse o conselheiro. Para isso, ele comenta que deve haver um engenheiro com a competência para ser o responsável técnico, além de inspetores com a devida qualificação. “No fim de cada inspeção, será emitido um certificado de trânsito”, ressaltou. Por variar entre características específicas, alguns produtos exigem transportes ainda mais adequados. Para gases e líquidos inflamáveis, os tanques devem ser à prova de vazamentos e possuir sistemas de contenção. Materiais explosivos ou radioativos Em caso de materiais explosivos ou radioativos, a locomoção deve ser feita em veículos isolados. A sinalização, por sua vez, é feita por meio de placas de identificação de ameaça, que contêm o número de risco e o número ONU, determinando qual a classe da substância em tráfego. [Conteúdo publicado na revista do Crea São Paulo]